Com a proximidade da morte, Iberê Camargo resolveu que parte de sua vida, por meio do registro memorialístico, deveria “acabar em um livro”. Mas, não obstante essa nota lateral que faço ao poeta Stéphane Mallarmé referindo, de passagem, uma imagem modelar de sua obra, cumpre advertir que o pintor gaúcho (e mais adiante o leitor talvez concorde que o adjetivo gentílico não é excessivo) é um “escritor” pré-mallarmaico. Tudo deveria acabar (bem!) em um livro. Mas, Iberê Camargo ainda não o sabia. Com efeito, afirmo isso porque para Iberê, escrever “pode ser, ou é, a necessidade de tocar a realidade que é a única segurança de nosso estar no mundo — o existir”. Isso representa tudo menos o feeling poético-escritural do autor do poema “Salut”, cujos questionamentos sobre os limites da expressão verbal o fizeram suspeitar do objeto resultante da nomeação. Mallarmé não investe sua força criativa na realidade (no ser), já que a considera um defeito na pureza do não-ser, que só se presentifica...
Ronald Augusto é poeta e ensaísta. Licenciado em Filosofia pela UFRGS e Mestre em Letras (Teoria, Crítica e Comparatismo) pela mesma universidade. É autor de, entre outros, Puya (1987), Vá de Valha (1992), Confissões Aplicadas (2004), No Assoalho Duro (2007), Cair de Costas (2012), Oliveira Silveira: poesia reunida (2012), e Decupagens Assim (2012). É colunista da revista http://www.mallarmargens.com/; e escreve quinzenalmente para http://www.sul21.com.br/jornal/colunista do site Sul21.