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Mostrando postagens de 2016

A ESPESSURA OSSAMA

A ESPESSURA OSSAMA DO POEMA Ronald Augusto [1] Ossama (Letras Contemporâneas e Editora da Casa) é o novo experimento neossimbolista – prefiro esse epíteto a neobarroco como meio de aproximação à áspera poesia – de Dennis Radünz. Entenda-se “experimento” como conquista, determinação inventiva, e não como acontecimento invertebrado ou sem desdobramentos. A ossama ( puzlle perverso) textual toda empilhada; os destroços de tradições e rupturas. Pilhagem de linguagens que entranha o corpo fraturado do poema. Análogos à imagem das estátuas jacentes metaforizadas por João Cabral, os poemas de Dennis Radünz falam do rosto e do sobrerrosto, da carne e da política, da cédula e do sangue, entretanto, todo esse conjunto de cifras corrosivas, inicialmente evocativo de certa realidade, só faz a poesia de Ossama se indispor (no sentido de uma negatividade crítica) radicalmente com o real. Não há sangue em sua poesia, Dennis Radünz abole personalidade e emoção atingindo o nervo de uma li

a poesia e a música popular

a poesia e a música popular [1] Ronald Augusto [2] “deus é o poeta, a música é de satanás” (machado de assis, dom casmurro , cap. ix). a poesia é o mundo da linguagem (décio pignatari, registro mnemônico), a música popular (mp) é a linguagem do mundo. no meu campo de referências, a mp se comporta como um sistema de signos diluidor daqueles elementos que no embate - ou na vivência - da cultura se estabelecem como constituintes pré-fabricados, quase ready-mades . os sinais que indicam a direção dessa cultura. a massa comendo o fino biscoito fabricado. fábrica áfrica. o repertório da mp, mais reduzido, ou melhor, se autoprocessando ruma à kitchização, arrecada maior audiência. sem dúvida alguma que, se a poesia, de uma hora para outra, passasse a ser a moeda usual da fala - favella - cotidiana, seria um salve-se quem puder. a poesia alimenta potencialmente a mp. mas isso não quer dizer que a mp seja desprovida de um aparelho próprio de produção/ as

o controle e o desvio

Arte e poesia medievais: o controle e o desvio Ronald Augusto [1] I .                    No rastro de E. H. Gombrich O papel da Igreja no mundo medieval é complexo e contraditório, entretanto, é como que consensual a crença de que o que se considera hoje a produção artística do período, grosso modo, assume a característica de ser uma transposição estética, pelo menos em termos de imagens e de obras arquitetônicas, da palavra sagrada. Em vários capítulos da obra de E. H. Gombrich, A História da Arte , por exemplo, deparamos um painel representativo tanto dos modos de realização, como de recepção da arte da Idade Média situando o problema entre os séculos VI e XIII. Nessa obra, Gombrich adverte que se ocupa de elementos da história da arte ocidental em que o período de Constantino passa a se adaptar aos preceitos do Papa Gregório Magno que instrumentaliza a arte com o objetivo de promover a educação religiosa dos leigos. Em certo sentido Idade Média e Igreja podem s

a fama como culto e impostura

Andy Warhol: a fama como culto e impostura Ronald Augusto [1]   Donald Kuspit abre o capítulo 5 (“Fame as the cure-all: The Charisma of Cynicism – Andy Warhol”) da obra The Cult of the Avant-Garde Artist (1993), com três epígrafes, e em uma delas há um comentário do próprio Andy Warhol em que se lê a seguinte afirmação: “Nos dias atuais se você é um trapaceiro/impostor, ainda assim você estará por cima” ou, como prefiro ler, “Nos dias atuais se você é um impostor, por isso mesmo você estará por cima”. A epígrafe se mostra importante por colocar já de início a noção de cinismo ou de culto à trapaça na arte de Warhol. Ao longo de sua análise, Kuspit relaciona essa senha paratextual à arte perversa de Warhol que, de resto, opera uma manipulação da ânsia contemporânea pela fama como cura para tudo (panaceia). Num primeiro momento de sua análise Donald Kuspit parece admitir que Warhol se relaciona com a fama de um modo fetichista, isto é, segundo o crítico, Warhol acreditar