Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de 2019

O que fazer com o esteta e o moralista?

O que fazer com o esteta e o moralista? Ronald Augusto [1] A estética, ao que parece, é um campo hesitante e algo controverso, capaz de, inclusive, confundir o interessado quando sua consideração a propósito do tema se dá, por exemplo, através dos termos dos pensadores do idealismo. De outra parte, aísthesis , o conceito grego de onde se origina a disciplina, significa sensação, sentimento. Mesmo que, historicamente, seja considerada como um ramo da filosofia, a estética aqui e ali é representada como uma disciplina meio lateral ou menos estável, afinal, a investigação estética não se dedica necessariamente a formas artísticas constituídas; seu interesse, de vocação esclarecida e racional, por experiências da sensibilidade e do afeto que se relacionam a uma série de objetos, a coloca, no entanto, constantemente em situações movediças e fungíveis, ainda mais quando se trata de determinar a precisão dos juízos e conhecimentos pretendidos. Um argumento que sustentaria a te

Solidariedade maledicente e infernópolis

Solidariedade maledicente e infernópolis Ronald Augusto [1] Todo mundo caiu de pau (e, em alguma medida, com razão) em cima do recém nomeado presidente da Fundação Cultural Palmares por causa de suas declarações e trollagens contra os movimentos negros. Por outro lado, e curiosamente, o antropólogo Antonio Risério há anos vem nos oferecendo a mesma qualidade de leviandades (só que com aquele verniz intelectual que tantos apreciam) e ninguém expressa um par de palavras para contraditá-lo. Mas, sim, Martinho da Vila respondeu aos comentários grosseiros de Sergio Nascimento de Camargo. Sim, o próprio irmão passou um pito neste cidadão. Sim, o pai é um importante escritor e tradicional militante negro. Encontrei essas notícias aqui e acolá, e gente conhecida, com presteza, veio me contar uma e outra novidade. Só que tudo isso ainda é informação irrelevante e maledicente, porque a intenção é demonizar o sujeito isolando-o do conjunto. Vocês não precisam disso para dizer qu

o 20 e a evasão do racismo à brasileira

[artigo  publicado originalmente em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/comportamento/noticia/2019/11/ronald-augusto-o-fim-de-novembro-e-a-evasao-do-racismo-a-brasileira-ck3k501jh00yn01ll4cbxrzuf.html ] Vinte de novembro e a evasão do racismo à brasileira Ronald Augusto [1] No início de novembro postei em minha página do F acebook o seguinte comentário: estamos no mês em que o Brasil finge dar atenção aos desejos e lutas de sua população negra. O sentido da ironia não visava deprimir o ânimo de uns, nem desprezar a empatia de outros em relação ao combate que deve ser movido contra o racismo institucional e individual. Pelo contrário, o interesse era afirmar que devemos pensar a mobilização antirracista como um imperativo moral ao problema estruturante de nossa formação e não apenas registrar uma efeméride sentimental por meio da qual se tenta purgar o trauma racial em que brancos e negros estão implicados, estes como vítimas, aqueles como patrocinadores (indiferente

A explicação no lugar da voz

A explicação no lugar da voz Ronald Augusto [1] A motivação para esse texto nasce de uma postagem [2] do poeta Heitor F erraz em sua página do Facebook a propósito de reportagem publicada no G1 sobre o Prêmio UBC 2019 [3] , con ferido ao compositor Milton Nascimento. Mauro Ferreira, blogueiro do portal, assina a matéria em que defende a posição segundo a qual a arte de Milton Nascimento “é tão grande que nem cabe explicação”. Na opinião do jornalista, durante o evento de premiação, nenhum amigo ou parceiro de Milton deu conta de explicar a grandeza divina dessa obra “vinda ninguém sabe de onde”. De outra parte, Heitor Ferraz questiona – e com razão, pois tudo na reportagem soa irritantemente laudatório – a visão sacralizadora e demasiadamente reificada sobre a arte de Milton Nascimento. O poeta salta para o campo oposto e argumenta que tal concepção acomoda “a cultura negra no campo dos milagres”. Para Ferraz, Milton “tem a voz da escravidão brasileira, voz que vem da

Miscelânea de algumas semanas

Miscelânea de algumas semanas Ronald Augusto [1] Na esportiva Tudo vai bem quando o time dos seus grandes amigos está numa situação pior do que a do seu. Porque quando a situação não é bem essa, é muito chato controlar a vontade de vê-los balançando numa árvore à beira do rio, afinal de contas, são seus camaradas. Acontece que aquele sorriso no rosto deles, enquanto oscilam ao sabor do vento, compensa todo constrangimento. Amigos para sempre. Ideia de girico Um gaúcho desvairado (redundância) imaginou uma cuia portentosa como alternativa à proposta da roda gigante na orla do Guaíba, ele se baseia no seguinte argumento: “melhor algo da nossa cultura do que da cultura inglesa”. Vamos elucidar dois pontos: 1. roda-gigante não é criação dos ingleses; e 2. mesmo que fosse, o futebol, por exemplo, não foi inventado pelos brasileiros, no entanto está entranhado em nosso imaginário cultural. Não basta ser brega, tem que ser burro para apoiar algumas façanhas . M

subir ao mural: leituras

SUBIR AO MURAL [1] Marco Aurélio de Souza [2] 1. É sempre arriscado comentar a grande poesia, quer dizer, a poesia que cumula recursos sonoros e semânticos com a precisão de pensamento – que poesia sem pensamento não pode ser grande nem boa, e o pensamento parece estar sempre em falta –, que forja imagens improváveis mediante o desvio incessante da obviedade, é sempre um risco comentar tal poesia: afinal, que pode um comentário dizer sem entregar a imaturidade do leitor? E o leitor de boa poesia, vale dizer, jamais está maduro. 2. A poesia de Ronald Augusto é destas que, por sua qualidade excepcional, intimidam o leitor desavisado, causando neste, ao final de cada poema, um momento de sincera reflexão. Que movimentos fez aqui este poeta? Fui capaz de acompanhá-lo? Tanto maior será o desafio para quem, como eu, pretende o comentário despretensioso (e como dizer com simplicidade o que excede o simples pelo capricho da linguagem?). 3. Publicado em 2017 pela Edit