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Mostrando postagens de janeiro, 2012

o calígrafo em Casa de Máscaras

péricles prade Entro em Casa de máscaras pelo pátio dos fundos. O crítico “rasteja/ a sombra [as sobras] à procura do corpo”, da parte viva, daquilo que, paradoxalmente, o signo mata e em seguida regenera por meio de uma forma constelada na página, ou seja, a qualidade do sentimento. Manchas gráficas que se compaginam, rastros indiciais da festa do intelecto (do espírito em espiras) de Péricles Prade. O poeta dá continuação ao seu esforço pleno de iluminações fortuitas seguindo resoluto para o indeterminado. Esse poeta que a um só tempo irriga e põe em questão a tradição tipográfica de que é filho, fecha Casa de máscaras agora como calígrafo. Rasuras de punho contra a usura dos significados dicionários, sua estocada de nanquim sobre a página branca e mallarmaica desenha um percurso textual de essencial intraduzibilidade que vai do nigredo (sepultamento do sentido) ao rubedo (epifania via linguagem), passando pelo albedo (pureza aquém-lexical). No centro de Casa de

Uma evocação impertinente

No Manifesto da Poesia Pau-Brasil (1923), podemos vislumbrar, talvez, as primeiras iluminações a respeito do carnaval enquanto sistema de signos e de comportamentos representativos, por assim dizer, da nossa diferença cultural exportável. Para Oswald, o carnaval opera a síntese espetacular e especular de nossa suposta brasilidade, conquistada — quem sabe como uma forma de auto-reparação — por meio de uma libidinosa performance musical, rítmica, coreográfica e visual, e que mais tarde se desdobrará, na perspectiva oswaldiana, na antropofagia ritual como traço de nossa formação.  Num certo sentido, o Manifesto do poeta do modernismo, é, ele mesmo, em diversos aspectos, um grande samba-enredo avant-la-lettre . Neste verdadeiro “samba do branco-doido”, Oswald de Andrade nos passa a sua falação de mitômano fazendo-nos cúmplices das suas ilusões e perplexidades. Engordamos esse corso que segue passando pela avenida.          No segundo parágrafo do Manifesto da Poesia Pau-Brasi

Cleci Silveira, recriando personalidade e emoção

Contrariamente ao que acontece com a maioria dos artistas da palavra cujos percursos textuais denunciam com o passar dos anos uma flagrante tendência à acomodação, há outra linhagem de criadores que não acompanha este fluxo até certo ponto entrópico. Pode-se dizer que os representantes de tal linhagem preservam, a contragosto do habitual, incorruptíveis sua vitalidade e juventude. Enquanto os primeiros, de ordinário, perdem o entusiasmo a partir do momento em que chegam às portas da “impudente idade do bom senso”, os segundos se insurgem contra a regra e passam a encarar a tradição menos como coisa herdada do que como conquista permanente. E desde o irredutivelmente pessoal de suas preferências estéticas estabelecem, por assim dizer, um desejo de abandono da consagração como topo cumulativo de feitos. Enfim, eles conservam intactos dentro de si o jovem artista e sua ininterrupta curiosidade. Pois é nesse rol que gostaria de ver incluído o nome de Cleci Silveira. Já que com a p

um guisado à la Ricardo Piglia

Borges afirmava, já no final da década de 1960, que o romance estava em declínio. Ao mesmo tempo defendia e projetava (como valores) a continuidade da história e da narrativa. O poeta argentino escrevia àquela altura que não veremos o dia em que “os homens se cansarão de contar e ouvir histórias”. O cinema, até meados do século 20, confirma em parte a previsão de Borges, ou seja, a sétima arte contribui para o encerramento do discurso romanesco, mas não deixa de lado a história nem as formas vertiginosas de narração. Excetuando o cinema-música, ou o metacinema, de Jean-Luc Godard, que a um só tempo – por meio da mobilidade fugidia da montagem –, dissipa e funde o ficcional e o documental de modo radical, pode-se dizer que a maioria dos realizadores ainda deposita bastante confiança nos poderes persuasivos da história, ainda que contada através das imagens. O diretor Raoul Walsh ( Seu último refúgio , 1941) costumava dizer: “Se você não tem a história, você não tem nada!” ( apud Martin