Para quem não torce o nariz para as conquistas do modernismo (aqui, no espaço estético do pampa, o professor extramuros acadêmicos, diz há anos que foi uma invenção dos paulistas do café), nem cospe no prato requintado da poesia concreta (que muitos comem pela beirada das traduções levadas a efeito pelos “trigênios vocalistas”), enfim, para quem (e é o meu caso) se sente alegremente implicado nas tensões de uma tradição mais recente da poesia, a participação ao lado de Jaime Madeiros Jr. no evento “Palavra, alegria da influência”, produzido pelo Fernando Ramos, foi uma lição de prazer e paciência.
Mais do que uma espaço puramente sonoro ou visual, a poesia ainda persiste como o lugar de quizilas estéticas imemoriais. Meu encontro fraterno com Jaime Medeiros Jr. serviu de pretexto para retomarmos (nós e a audiência pequena, porém provocadora) os debates que, não obstante alguns deles já não nos digam mais respeito, ainda nos encantam e nos fazem argumentar como se tivéssemos testemunhado episódios ocorridos há quase um século.
Como o futebol, poesia é uma cachaça. Ainda lembramos e defendemos os times de nossa infância encarnados em botões de acrílico. Leitura de poesia seguida ou entremeada de debates nos rejuvenesce até certo ponto. Mas, no dia seguinte, rememorando a noitada, fica a impressão de que a firmeza das posições defendidas a plenos pulmões, não passou de teimosia provecta vertida numa prosa estranha à audiência. Mas, quem esteve na Palavraria (meu abraço à Carla, ao Heron e ao Carlos), não saiu frustrado, testemunhou belas esquizofrenias em diálogos de nível.
A poesia é a prova dos nove, tresleio Oswald de Andrade. A canção diz que tristeza não tem fim; a poesia, que a influência não tem fim.
Na oportunidade, além dos do Jaime e alguns dos meus, li um poema do Claudio Cruz, do seu livro recém lançado A ilha do tesouro e outros poemas. Acho-o apropriado para encerrar esta crônica.
Poesia
Tudo havia de chegar mais tarde.
Formatura, casamento, filhos.
Emprego sério, dinheiro certo,
certa calma.
Tudo havia de chegar mais tarde.
Só tu chegaste cedo.
Com uma flor de humor entre os lábios,
soubeste esperar por tudo,
sentada,
em meu quarto.
O motivo de tua longa espera até hoje não sei.
Mas aceito-a como uma dádiva.
Como se Deus andasse comigo de mãos dadas.
Comentários
um ab
(se tb acabasse com a barriga, ser poeta seria ainda melhor! rs)
E viva o concretismo! Todos ataques, creio eu, são tentativas de criar o novo, de ruptura. Natural estratégia mais retórica que prática (a prática não tem tanta força). O próprio foi feito pelos concretistas, lá atrás, declarando a morte do verso etc. Mas há de nascer o que os ultrapasse. Nossas tradições mais modernas ainda são, sim, o mais moderno. Enfim, são meus humildes pitacos de cá.
Grande abraço!