Sempre achei os poemas
da Elisa Lucinda muito chatos e algo afetados. A rigor nem são poemas, mas
textos onde rimas aparecem como penduricalhos e que são ditos (com competência)
por uma boa atriz, só isso. Ainda que esse preâmbulo não tenha a ver, ao menos
aparentemente, com o assunto do meu comentário, me pareceu oportuno fazer a
menção, pois ele dá um colorido especial tanto ao que vem a seguir, quanto ao
seu fecho.
Não faz muito a atriz
postou em seu perfil no facebook um texto em defesa do ator e diretor Miguel Falabella
e do tal seriado "Sexo e as negas" do qual Falabella é o idealizador.
De forma bem sucinta pretendo comentar alguns tópicos do arrazoado de Elisa
Lucinda. Então vejamos. A defesa da atriz invoca, em primeiro lugar, a
necessidade de espaço para os atores negros (mas a que custo?) na TV e na
teledramaturgia brasileiras. Até aí tudo bem, todos já estamos cansados de
assistir atores negros fazendo papel de negro, como se não fossem talhados para
outra coisa a não ser repetir os estereótipos que a sociedade espera deles. Esses
atores fazem parte de uma espécie de “núcleo étnico”. Curioso é que o conceito
de “étnico” não inclui atores brancos de ascendência europeia. Mas,
paradoxalmente, diante desse quadro, Elisa sugere que os atores negros não
podem desperdiçar qualquer oportunidade de trabalho, inclusive porque, segundo
o adágio popular que serve de base ao seu raciocínio, neste caso poderíamos suspirar algo do tipo “dos males o menor”. Como se os negros que hoje decoram
o televisivo “Esquenta” estivessem em situação melhor do que as remotas mulatas
do Sargentelli.
Mas pior do que essa
posição colaboracionista de Elisa Lucinda é sua justificativa para tolerarmos
Falabella. Elisa diz que a mente do Falabella é suburbana ou simpática ao
imaginário desse povo alegre, isto é, que ele teria
o feeling para falar da comunidade e
que, além disso, sempre escalou atores negros em suas produções e projetos.
Resta saber que representações esses atores negros encarnaram ou ainda encarnam?
Por isto, tais fatos não significam que este cidadão não traga em sua cabeça
esteticamente suburbana concepções preconceituosas, racistas e misóginas,
afinal, o racismo e o machismo também estão, sim, nas comunidades. A cor de
pele no Brasil faz as vezes de um patrimônio (assim como o gênero), onde quer
que estivermos a branquitude e o masculino se impõem como bônus. Então, Miguel
Falabella até pode ser sensível ao sabor suburbano, mas disso não se segue que
não seja um reprodutor dos tradicionais preconceitos contra o negro e a mulher.
Em outro momento de sua
postagem Elisa Lucinda repete o batido chavão da censura ao humor a propósito
dos críticos do seriado “Sexo e as negas”, e propõe, em tom de manifesto, que
devemos tirar o band aid dos traumas,
insiste no valor do chiste como purgação dos medos, enfim, Elisa se utiliza de uma
enfiada de clichês conciliatórios. Por outro lado, me pergunto: que humor covarde
é esse que se compraz em colocar na alça de mira do seu riso reacionário aqueles
que tradicionalmente, na escala social, são relegados à subalternidade ou à
invisibilidade? Não é um humor em sentido forte – que subverte a convenção –,
trata-se de um humor classe média votado a manter tudo e todos no mesmo lugar,
um humor cujos alvos são sempre os mesmos: negros, homossexuais, gordos,
pobres, mulheres, enfim, isso que se transforma na zorra total patrocinada
pelos filósofos do subúrbio cenográfico.
Por fim, uma referência
confusa que não entendi. Elisa Lucinda parece colocar em pé de igualdade ou
estabelece uma analogia desse movimento de repúdio ao seriado "Sexo e as
negas" com o ato criminoso e isolado do sujeito (os jornais o descrevem como sendo de "cor parda") que tentou atear fogo à
casa da torcedora racista envolvida no episódio com o jogador Aranha. Elisa
lembrou que isso remete às técnicas de combate da Ku Klux Klan.
Nossa! Tal comparação é de uma leviandade sem cabimento. Com essa tirada Elisa
Lucinda se comporta, ao menos para mim, como uma mucama da casa-grande
defendendo o seu sinhozinho a qualquer custo. Ou seja, aqueles que querem a
punição para quem chama um negro de "macaco", aqueles que percebem o
preconceito sugerido num título como "Sexo e as negas", seriam,
portanto, os verdadeiros intolerantes com o bom humor e o combateriam usando os
métodos mais racistas e violentos de que temos notícia? Impressionante.
Minha cara, Elisa Lucinda,
só tenho uma coisa a lhe dizer: por enquanto você é menos deletéria para o
pensamento fazendo sua poesia. Ainda que sua poesia seja ruim, ao menos enquanto
você se dedica a este afazer acaba atrapalhando menos.
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