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Mostrando postagens de novembro, 2017

tretas sobre a mulatice

[A propósito de umas tretas que o antropólogo Antonio Risério andou publicando no FB] 1. De saída, algo que já se tornou um clássico. A testemunha negra [no caso Joel Rufino] favorável ao ponto de vista do branco [no caso Antonio Risério] que, nesta situação, pretende provar que os demais negros estão enganados ao recusarem a noção de mestiço e seu dégradé como alternativa à distinção-cisão entre negros e brancos que, há mais de 300 anos, representa ou descreve nossos conflitos étnicos fundados sobre um antiquado raciocínio de base racial. Nestas situações é conveniente que se conceda, de bom grado, autoridade e competência a alguma testemunha negra que venha, claro, abonar o ponto de vista do objetor, justamente porque a dramaticidade desse tipo de depoimento serve para reforçar a intenção de desqualificação das lutas e posições dos negros (reduzidas a mero ressentimento) contra todas as formas de racismo disfarçado. 2. O que Risério chama de “racialismo de resultado...

naturalizar a diversidade literária

Em 23 de outubro de 2017, com a chamada “As feiras literárias precisam naturalizar a presença de escritores negros” apareceu no site Nonada esta entrevista que foi conduzida pela Jornalista Thais Seganfredo. Como a entrevista foi gravada e sempre ficam lacunas e tropeços típicos da expressão oral, resolvi republicar aqui no Poesia-pau com pequenas alterações com o intuito de dar mais precisão ao texto e às ideias. Para quem quiser cotejar, a entrevista original pode ser lida em: http://www.nonada.com.br/2017/10/ronald-augusto/ * Nonada – Você já publicou diversos livros na carreira em editoras comerciais também. Agora prepara o lançamento de  Subir ao Mural , que vai ter produção artesanal. Por que essa escolha por uma editora independente? Ronald Augusto – De tempos em tempos, eu sempre faço alguma coisa retomando aquilo que eu fazia lá no início, em 1983, publicar livros quase artesanais e de baixa tiragem. Eu gosto de fazer isso, em parte porque o ...

menoridade intelectual da branquitude

Racismo e menoridade intelectual da branquitude Ronald Augusto [1] Sensível leitor, imagine um escritor tido e havido, tanto por seus pares quanto pelo público em geral, como grande e importante. Muito bem, imagine que esse escritor faz uma de suas viagens internacionais e ao desembarcar, por exemplo, no aeroporto Charles de Gaulle por algum motivo se perde no labirinto do glorioso terminal aeroportuário. Imagine que desafortunadamente um funcionário negro do lugar não lhe dá a menor conversa e começa, inclusive, a tirar a maior onda de sua desatenção ou incapacidade para se localizar nesse dédalo. Agora imagine que esse escritor renomado, no momento em que se desvencilha da situação, encontrando a saída, se vira para o funcionário (lembre-se de que ele não o serviu conforme o desejado e ainda foi debochado), se vira para o funcionário e diz em tom de desforra: “Vai te catar, negão!”. Ademais, imagine que o escritor confessa que sempre achou o racismo abominável e injusto. I...

Um supremacista menor

Um supremacista menor Ronald Augusto [1] No tocante aos casos explícitos e documentados de agressão racial contra negros, já virou rotina acontecer o seguinte (anotem e depois me cobrem): horas depois desses episódios protagonizados, de ordinário, por brancos, surge uma onda de empatia branca em defesa do eventual agressor. Recentemente foi este, por exemplo, o tom de diversas manifestações após os xingamentos racistas da torcedora gremista, branca, direcionados ao goleiro Aranha e que, felizmente, as câmeras registraram. Pois agora, o mesmo começou a ocorrer tão logo se tornou público o vazamento de um vídeo em que o âncora William Waack é capturado expressando juízo racista sobre um indivíduo, supostamente negro, a um interlocutor que, ao que parece, concorda sorrindo com a opinião do jornalista, como se vê nas imagens. Iguais de Waack, isto é, brancos ou companheiros de profissão, tanto de esquerda como de direita, já se referem ao fato ou à coisa toda como um des...

Dois modos de escravidão: a do essencialismo e a do fisiologismo

Dois modos de escravidão: a do essencialismo e a do fisiologismo Ronald Augusto [1] Desgraçadamente, embora dentro de certa rotina, poucos não deixaram vazar seu racismo ao comentar o caso bizarro da ministra (do PSDB) que serve ao governo golpista em condição, segundo ela, de quase escravidão devido a uma depreciação salarial. É duro afirmar isso, porém a ministra reforçou a noção de que negros de direita pensam como negros da casa-grande: esses que preservam por todos os meios, lícitos ou ilícitos, a própria sobrevivência, a própria pele. Porém, é preciso dizer melhor, para ficar mais rente à realidade: geralmente negros nos escalões de qualquer governo pensam ou são amados como negros da casa-grande. Um ponto que é importante não esquecer é que estamos nos referindo, sim, a alguém que é do PSDB e que participa do governo mais impopular da história. Ainda que haja um vapor racista na polêmica, não posso negligenciar a solidariedade da ministra com essa situação h...

os mortos na sala de jantar

A MESA POSTA Ronald Augusto (*)          Começo essa precária leitura do livro Os mortos na sala de jantar (Realejo Edições, 2007) de Ademir Demarchi – poeta paranaense não-paranaense radicado em Santos –, sob o signo de uma máxima de Nietzsche que diz: “Por fim amamos o próprio desejo, e não o desejado” ( Além do bem e do mal , 1885). Com efeito, nosso apetite pela morte e suas representações só diminui quando, a contrapelo da famosa boutade de Duchamp, nos damos conta de que nem sempre são apenas os outros que morrem. Entretanto, graças a essa dura percepção de que a vida nos facultará, cedo ou tarde, um enterramento, é que Ademir pode esboçar as linhas de um sorriso e sonhar com uma “lápide” de Jacques Lacan, na qual constasse: “Não poderíamos agüentar nossas vidas se não tivéssemos a certeza de que, um dia, essa história vai acabar”. Mas, expressões do tipo “mais cedo ou mais tarde”, “um dia”, não passam de circunlóquios disfêmic...